sábado, 30 de maio de 2015

O Conto do Boneco de Neve

Já acostumado aos nove meses de inverno que acontece por aqui, posso dizer que alguma coisa anda mudando e que o tal de “aquecimento global” modificou alguma coisa. No último ano, para compensar a nevasca do anterior, o frio foi mais ameno e este ano demorou a chegar. Ano passado comprei umas peças novas de inverno que ficaram esperando o momento certo do uso, mas só agora é que sua utilidade será testada. Pois é... hoje está muito frio e vou contar (de novo – é remake) uma historinha sobre um desses dias bem frios. 

Lá naquele lugar que nunca aconteceu, meus queridos personagens tiveram alguma dificuldade para acordar. Com as caras amassadas e os cabelos bem despenteados, que foram presos por elásticos e gorros, lavaram o rosto, escovaram os dentes e foram tomar o café da manhã, cujo cheiro inundava a cozinha de tanta coisa boa que fora preparada pela Tia Nastácia (“dá licença, seu Lobato?”). 

Depois de servidos muitos sanduíches e bolinhos de chuva, além de chocolate quente preparado com uma antiga receita da muito e muito velha avó e que a velha mãe também fazia, Ana, Adrielle e o Guri resolveram montar uma “cabaninha” e contar histórias, já que brincar no quintal não foi uma ideia muito interessante naquele momento. Embaixo do enorme lençol, esticado por sobre cabos de vassoura, pijamas de grosso moletom, com desenhos de temas diversos, gorros, luvas e meias (daquelas de dedinhos coloridos) completaram o visual do acampamento improvisado, para onde levaram o farto desjejum. 

Enquanto isso, do lado de fora da casa, os yetis guardiões das meninas ajudavam Tia Nastácia a espantar uns pinguins que insistiam em entrar na casa e ficar ao lado do fogão a lenha (sim... esse dia tava frio mesmo!). Em dado momento, eles pediram licença, vestiram uns casacos, calçaram umas enormes meias (to falando que o dia era frio e não estava fácil nem para os yetis) e foram, com o Dragão, até um local próximo onde nevara e juntaram alguns sacos das estrelinhas de gelo. Na volta, por via das dúvidas, dispensaram o Dragão, depois de agradecer, pois tinham medo que ele espirrasse. 

A ideia era agradar as crianças: moldaram a neve em bolas grandes sendo a maior na base, outra menor no meio e outra por cima, servindo de cabeça para a escultura. Pegaram uma cenoura na cozinha, alguns outros adereços só que o Dragão, curioso, resolveu dar uma espiadinha. 

Dentro da casa, o implacável frio obrigou Adrielle a pegar uma caixinha de madeira de onde tirou três esferas metálicas que flutuaram, ganharam mais brilho e aqueceram o iglu onde eles conversavam animadamente. 

- Mas não era “cabaninha”, Narrador? 
- Fica quieto, Quati! Iglu ficou mais adequado ao texto. 

Uma pena perdida de quero-quero foi o suficiente: de forma certeira, a narina direita do Dragão foi atingida e saiu yeti voando pra tudo quanto é lado, depois do estrondoso espirro. 

- Nãooooooooooooooooooooo!!!!!! - gritou Tia Nastácia. 

Desolados, molhados e chamuscados, os yetis olharam para o Dragão que, algo envergonhado, só conseguiu dizer uma palavra, antes de sair voando para sua caverna: 

- Ops! 

As crianças nem tiveram tempo para entender a barulheira, quando outro estrondo, seguido de um apagão, ecoou na casa. 

 - Adrielle, de novo não! Outro apagão? 
- Ei, sem essa, não tenho nada com isso. Foi algo lá fora! 
- Vamos ver então. 

Um boneco de neve, procurando terras mais quentes, caíra que nem a Estrelinha (ainda vou contar esse história), bem no jardim da casa. Só que ele também esbarrou nos fios de energia e tudo escureceu. 

- Que lugar é esse? É a Bahia? 

Esclarecido de sua localização, agradeceu o convite de hospedagem, pediu um chocolate quente, foi servido, despediu-se e concluiu: 

- Obrigado por tudo. Estou procurando uns pinguins. Aqui é muito frio. Vou é pra Bahia! Fui............................

 
Boa Tarde! Eu sou o Narrador.

domingo, 24 de maio de 2015

O que você acha que as cores fazem por você?

Dias cinzas e chuvosos já são característicos do outono que também é entremeado com outros dias mais azuis e de sol. Dizem que essa estação é uma mistura de todas as outras, o que dificulta um pouco escolher uma roupa na hora de sair de casa de manhã. Como “levar casaco” já faz parte do nosso dia a dia (principalmente nas viagens), agora essa necessidade torna-se mais constante. 

Há uns quatro anos eu escrevi um texto sobre uma pergunta que uma amiga me fez sobre as cores. Acho que era para um trabalho de escola (realmente não lembro bem o motivo) e resolvi escrever a espeito. À época, a grande dificuldade foi encontrar uma forma certa de fazer isso e várias ideias vieram na minha cabeça. 

Uma delas, que foi a escolhida, foi falar de dias. Pensei em montar um mosaico, daqueles “coloridos-coloridinhos”, como pastilhinhas de parede de prédio antigo e colocadas numa caixinha como se fosse um pequeno arquivo. Essa inspiração veio do antigo blog da Emi, quando ela falou de um “Diário Infinito de Frases” e cada pecinha do meu mosaico representaria uma data específica. 

Logo no início eu procuraria um daqueles dias especiais e escolheria as cores mais bonitas para ilustrar. Claro que algumas peças desse mosaico seriam sem cor, pois são aqueles dias que desejamos “deletar” das nossas vidas e foi aí que eu consegui a resposta à pergunta da amiga: 

“- Cor é vida... o que não tem cor é representado pelas trevas.” 

E aí eu deixo um desafio aos meus quatorze leitores, principalmente aqueles que reencontraram as cores perdidas da infância nesses livros de colorir: 

- O que você acha que as cores fazem por você? 


Boa Noite! Eu sou o Narrador.  

N.N.: O “Diário Infinito de Frase” foi uma ideia da Natália Rosin, mas não encontrei mais o post original. Deixo aqui uma outra descrição a respeito. 
N.N.2: O blog atual da Emi (recomendo) se chama “Misturista”. 
N.N.3: As ilustrações do livro “Jardim Secreto”, que aparecem na foto, são da Zilda (sem permissão... mas acho que ela não vai ficar zangada comigo não!).

domingo, 17 de maio de 2015

O Aquário

”Eu preciso de um apoio: minha vida e minha obra são imprevisíveis e eu preciso de alguém que entenda isso e que possa estar lá quando eu não puder; alguém que entenda que quando eu não estou lá é porque eu preciso estar aonde eu estiver. Preciso de alguém que acredite e apoie isso. Pareço louca, mas eu não sou!” (Grey's Anatomy – 11x09 – versão livre do diálogo de Meredith com a candidata a babá) 

- Vendo "Grey's Anatomy"? 
- Sim! Yasmin adora... tanto que ela dormiu em menos de 1 minuto de filme! - Mônica riu. 
- E como foi lá? Ela melhorou? 

Depois do nascimento de Rodrigo, coberto de imprevistos, Bia mudou: bebê prematuro (não foi um prematuro grave, mas sempre dá mais trabalho – ele está bem atualmente, sem problemas), marido de licença médica (já está recuperado também e já voltou a jogar futebol com os amigos quando é possível) e retorno ao trabalho (Bia é formada em jornalismo, tem um blog, e passou um tempo frequentando alguns ativismos relacionados a gravidez e parto, usando um pouco da experiência que ganhou no nascimento do bebê), a amizade das duas não chegou a estremecer, mas alguma coisa diferente acontecera. Mônica esteve lá algumas vezes, mas Bia estava sempre ocupada com alguma coisa e as visitas eram rápidas. 

Dessa vez, na comemoração do aniversário do filho (só um bolinho mesmo, para marcar a data), ela estava mais calma e puderam conversar. 

- Sabe, Mônica, foi muita piração e peço até desculpas... 
- Sem essa, Bia! Somos amigas e amigos entendem tudo! 
- Não! Eu passei dos limites! 

Agora, escrevendo um livro e alguns artigos, para a revista que trabalha, ela reflete sobre tudo.

- Quase perdi meu casamento em cima dessa loucura que foi o ativismo! Você não imagina as coisas que eu li, que eu ouvi e, você sabe, cabeça de jornalista viaja mesmo, principalmente quando passa por problemas e resolve entender o que existe. O que mais chamou a atenção foram pessoas que ficaram deprimidas e tristes porque seus "planos" não deram certo, mas continuaram sadias, com filhos normais e vida sossegada. E quem falou que estava nos meus planos o meu acidente? Vamos cantar parabéns? 

Yasmin ficara entretida, com um aquário virtual, e não prestou atenção quando Mônica chamou, mas quando soube que era a “hora do bolo”, saiu correndo para cantar também (do jeito dela, claro!). Depois do festejo, retomou a distração.

- Ela gosta muito de peixes. Sempre vamos ao mercado da ilha assistir a chegada dos pescadores. 
- Esse aquário é ótimo. Pensei num de verdade, mas seria outra coisa pra cuidar e aí isso não ia prestar. 

A hora passou rápido, chegaram as despedidas e Mônica foi embora, sob os protestos de Yasmin. 

- E o que ela concluiu? - perguntou Leo. 
- O mesmo de sempre: fodam-se os intelectualóides que acham que sabem de tudo e, ainda por cima, querem que os outros só façam o que eles dizem, porque só o que eles dizem é que está certo. Para eles, o melhor seria ter um aquário, só que cheio de humanos que nada mais fariam do que nadar de um lado para o outro sem chegar a lugar algum. 
- Bom... pelo visto ela melhorou e você (ainda bem) continua a mesma! - Leo riu. 
- A sorte dela é que ela não é a Meredith... aliás... a minha sorte também! Você leva Yasmin pra cama? 




Boa Tarde! Eu sou o Narrador.  

N.N.: Quer ler mais sobre “Leo e Mônica”? Clique aqui.

sábado, 9 de maio de 2015

O Conto do Amigo Invisível

Numa noite clara e bem fria, de um outono qualquer, o Guri apareceu com um caderno do Narrador, onde ficavam histórias quase esquecidas. 

- Leia uma para nós! - pediu Melinda. 
- Se o Narrador não se importar... 
- Manda ver, Guri! 

"No tempo que usava tranças e fitas vermelhas no cabelo, onde brincar era a coisa mais séria da vida (brincar sempre é coisa séria), ela conversava com bonecas e só dormia com aquele travesseiro de ursinho (isso ela faz até hoje) e nem via o tempo passar do lado de fora da janela. Um dia surgiu mais alguém: um amigo só dela, que ninguém via, e com ele conversava, contava seus segredos e pedia conselhos. As pessoas achavam estranho, mas não ligavam porque era coisa de criança. Só que, para ela, ele era de verdade e, de tanta verdade, aos poucos, ele foi criando vida, enquanto ela crescia e não usava mais tranças e nem fitas. 

Um dia ela pediu sua materialização: seria um dia especial, onde ela usaria um vestido de moça grande e deixaria de ser aquela menininha que só sonhava, para transformar o sonho em realidade. Só que, a partir de seu desejo, ele começou a causar medo naquelas pessoas que achavam que ele era somente fruto de sua imaginação. Ah! As pessoas tem medo do amigo invisível, pois elas esqueceram que o tiveram também e porque ele faz lembrar do tempo dos sonhos verdes 

A menina que usava tranças ficou triste porque ele não foi; ele ficou triste porque deixara de ser invisível e não pode ir; e, ambos tristes, seguiram seu destino em direção ao futuro... "

- Ah! Narrador! Essa sua historia antiga é muito triste. Se a gente estivesse lá, tudo poderia ser bem diferente! 
- Como assim, Adrielle? 
- Fácil! O começo poderia ser parecido: "aí ela cresceu, viajou para longe, fez faculdade, casou e constituiu família. Os brinquedos e o seu amigo invisível ficaram meio esquecidos no tempo, mas a amizade continuou". 
- Um belo dia – Ana continuou – ele viajou para a cidade dela e propôs um encontro, mas claro que isso não seria muito fácil, porque as agendas eram lotadas, muitas atividades, enfim, essas coisas de adulto que são um saco. 
- E onde vocês entrariam nisso? 
- Sei lá! Mas a coisa aconteceria assim: "Numa manhã de sol de início de primavera, um sujeito salta de um táxi, numa praça de um lugar distante, dirige-se a um guarda, faz uma pergunta qualquer e encontra um desses cafés no entorno dessa praça. Consulta o celular algumas vezes, escolhe uma mesa, dispensa o garçom momentaneamente e gira a cabeça de um lado para o outro, como se aguardasse alguém. Em dado momento ele dá um sorriso: ao longe, descendo uma ladeira, completamente apressada, uma bela moça, com longos cabelos negros e esvoaçantes, contrastando com uma capa que usava, vem em em sua direção. Cumprimentam-se com um abraço, sentam numa mesa, pedem cafés e pastéis de nata, conversam, ele entrega presentes, eles fazem selfies (para imortalizar a cena), terminam o café, pedem a conta, despedem-se e ela vai embora, tão apressada quanto veio."

 - Não ficou melhor? 
-  Hum... certamente! - concluiu o Narrador.
 - Crianças, hora de dormir! - disse o Mago. 

Todos caminharam para seus quartos, à exceção de Ana, que foi ter com ele. 

- O que deseja, pequenina? 
- Saber se você gostou dessa outra história. 
- Eu sempre soube que tinha dedo de vocês nesse outro caso.
- Como se você não soubesse, né? - ela riu! 
- Durma bem, Beatriz! 
- Só você me chama assim...  


Boa Noite! Eu sou o Narrador.

domingo, 3 de maio de 2015

Eu Sei

Antes de partir com Melinda, para trilhar o tempo, guiados por Deborah, o Guri participou de diversas histórias e, como Sherazade (شهرزاد), mil e uma noites de histórias poderiam ser contadas sobre ele, mas uma em especial eu gostei muito. 

Ele tinha uma amiga um pouquinho mais velha que ele; sua característica era ficar em rubro (algo tímida, talvez). Nada disso fazia muita diferença: se ele morasse num sótão, ela subiria uma escada de jardim e entraria pela janela, como já outras fizeram em outros mundos. Cresceram juntos, brincaram juntos até que chegou aquele dia: ela “espichou”, ele ficou. Magrela, muito bonitinha e ainda desengonçada (sem perder a beleza e a vaidade), enquanto ele permanecia baixo e algo gordinho (isso mudou com o tempo). 

Ainda conversavam? Claro que sim! Se bem que só fora do colégio (são séries diferentes), naqueles momentos das crises da idade e quando recordam os “papos seríssimos” que sempre tiveram (essas amizades são assim). Observar os dois, de longe, chega a ser divertido: ela passa, dá um sorrisinho e segue adiante, enquanto ele aguarda o momento de elogiar o passado. 

Só que um dia eles brigaram feio e, num poema, talvez inspirado por uma música, ele mandou todo o seu sentimento: 

“Naquele tempo, eu era moleque de rua, 
Vivia jogando bola e correndo de um lado para o outro 
E você só ria, assistindo aquilo tudo, 
Enquanto brincava com suas bonecas. 

E eu implicava com você... 
Acho que gostava do seu sorriso aborrecido 
E isso até era um brinquedo meu, 
Só que a gente sabia que éramos diferentes dos outros... 

E de onde você tirou a ideia 
Que, hoje, eu não te veria deitada aí na varanda, 
Enquanto você lia este livro, misturando suas cores com o azul do céu 
E a pintura da parede? 

Hora de fechar a porta, pois vá que o telefone toque 
E aí pode ser aquele tal alguém que nos separa, 
Com quem você vai ficar falando horas, 
Enquanto eu dou as costas e vou embora... 

Assim, volte para cá e veja 
Exatamente o que você significa para mim, 
Já que você sempre teve o dom de me levar  
Lá pra longe, onde vivemos nossas promessas...” 

E ele partiu tão triste, achando que tudo se acabara num momento de pouco tato (voltou depois, mas não era mais como antes). Ela também sumiu das vistas por um longo tempo. Um belo dia, sei lá quando, ela apareceu. 

Quando surgiu à janela, seus cabelos de ouro brilharam ao sol e seus olhos de mel, agora mais sérios, fitaram o Mago à distância. Disfarçou, ofereceu um pinhão a um serelepe; este veio a seu encontro e ela o acariciou, encostou seus pelos macios em seu rosto e entregou-lhe um envelope, que mais tarde chegaria às mãos do Mago. 

“Leia e faça chegar ao Guri” – estava escrito! 

“Vivi muito tempo sem entender algumas coisas: que os acontecimentos dependem do que arriscamos. Nesse nosso conto de fadas, sonhado quando estávamos acordados, eu confundi tudo e descobri, tarde demais, que os desejos feitos às estrelas se transformam em realidade. Siga feliz, ajude sua nova amiga a encontrar o seu destino. Conte a ela o que você sempre me disse: "que a força é uma coisa que você escolhe ter..." E eu jamais esquecerei disso. Beijos no coração. Eu também sempre estarei com você aonde você estiver.” 

E ela também partiu e nunca mais apareceu...

 



Boa Noite! Eu sou o Narrador.

sábado, 2 de maio de 2015

Pelas terras do além-mar

"Muito além dos confins inexplorados da região mais brega da Borda Ocidental desta Galáxia, há um pequeno sol amarelo e esquecido. Girando em torno deste sol, a uma distância de cerca de 148 milhões de quilômetros, há um planetinha verde-azulado absolutamente insignificante, cujas formas de vida, descendentes de primatas, são tão extraordinariamente primitivas que ainda acham que relógios digitais ainda são uma grande ideia" (Douglas Adams – O Guia do Mochileiro das Galáxias) 
  …........
Significado de Férias s.f.pl. "Época de repouso. O corpo humano não pode atuar com toda sua potencialidade sem períodos frequentes de repouso. Há muito os médicos reconheceram que várias doenças do corpo e do sistema nervoso podem ser curadas apenas com a ausência da atividade normal e cotidiana. A mudança da rotina cotidiana que ajuda a restaurar o corpo, a mente e a disposição das pessoas chama-se férias."(Dicionário Online de Português) 

Então... pois! 

Antes de conhecer terras distantes vale a pena dar uma estudada, conversar com pessoas mais experientes e consultar o Google. Fazendo isso, ao final da viagem, você entenderá que tudo foi em vão e que boa parte das coisas que você aprendeu e planejou, nessas pesquisas, foram totalmente inúteis. O grande detalhe é saber o que aconteceria se você não fizesse tal planejamento. 

A primeira sensação que você experimenta acontece naquele momento da mudança do fuso horário, onde algumas horas são “puladas” e você toma café da manhã no horário onde você estaria dormindo, eventualmente bêbado, assistindo um programa de leilões ou alguma sessão religiosa de autoajuda. A conclusão é que você não mudou de país e sim atravessou um portal dimensional, principalmente quando a cadeira do avião chega a ser pior do que a do ônibus intermunicipal. 

Sem desanimar (“Don't Panic”), você toma um café bem forte (já que não resta muita coisa a fazer) e sai pela cidade a procura das diversas características típicas locais. Sua mala, repleta de “utilidades”, é deixada para trás e substituída por uma mochila (tão repleta como), onde você encontra de tudo menos uma toalha, que seria a melhor coisa a levar, se você tivesse consultado a literatura correta. 

Nessa nova dimensão (agora já devidamente adaptado), você desfruta de belas paisagens, admira construções da época medieval e começa a pensar como é que os sujeitos da época conseguiram construir tantos monumentos e castelos, considerando a tecnologia, teoricamente, terráquea e primitiva (eles seriam bem úteis, nos tempos atuais, para concluir algumas “obras da Copa”, principalmente as dos aeroportos). Considerando que, em determinado momento, o planeta foi destruído pelo Vogons, para a construção de uma via intergaláctica, e reconstruído tempos depois, quem sabe alguma tecnologia alienígena foi deixada para trás (assim como alguns representantes que deram origem ao Elvis, ao Raul, ao João Maria, dentre outros). 

Nos diversos passeios você precisa de algum veículo, para o seu transporte e de seus 41 companheiros de viagem, e um ônibus é a solução. O que suas pesquisas não contaram é que as estradas não possuem vários locais para eventuais paradas estratégicas e que os autocarros locais não possuem o indispensável “WC”, logo, a toalha anteriormente citada pode vir a ter um outro uso, em caso de acidente fisiológico. 

A alimentação é outro item indispensável e os quilos adquiridos com as guloseimas serão deixados por lá nas intermináveis caminhadas entre o check-in e o portão de embarque dos aeroportos, nas incursões pelas “lojinhas” e no carregar das compras. Para evitar acidentes durante as degustações, se você for comer coelho certifique-se que ninguém do grupo possui algum trauma de infância relacionado ao bichinho e que o gato bem gordo que circula entre as mesas ainda estará lá ao término do jantar. Um outro detalhe importante é tomar cuidado com o que pede nos restaurantes: o cardápio será estranho e se você tentar pedir algo em português (brasileiro), certifique-se da tradução. Na Espanha, por exemplo, a tradução de polvo (aquele bichinho marinho cheio de tentáculos) é “puelo”; se você insistir em “polvo”, poderá conhecer vários homens e mulheres interessados numa relação sexual, ou em oferecer heroína (droga), causando vários transtornos. 

Como a comunicação é indispensável nos dias de hoje, um smartfone com acesso à Internet é fundamental. Saber das notícias do mundo de lá, falar com familiares utilizando a tecnologia, consultar mapas, tudo é facilitado pelo Wi-Fi. Caso seus familiares não compartilhem da tecnologia, um “SIM card” local é uma ótima opção, para evitar as tarifas abusivas que são cobradas pela sua operadora de celular. O grande problema é que você começa a pensar, depois de ler sobre o tufão de Xanxerê, o terremoto no Nepal, o vulcão do Chile, as manifestações dos professores no Paraná e a greve na TAP, que os Vogons voltaram e que não haverá mundo no seu retorno à pátria. 

Enfim... o que importa mesmo é o amor ao que se faz, mesmo que “a Enciclopédia Galáctica defina o amor como algo incrivelmente complicado de se explicar e que o Guia do Mochileiro das Galáxias defina amor como algo geralmente doloroso e, se puder, evite-o. Mas para o azar dos terráqueos, eles nunca leram o Guia do Mochileiro das Galáxias.”


Bom Dia (ou será boa noite? – ah! esse jet lag!)! Eu sou o Narrador.  

N.N: Segundo o Guia do Mochileiro das Galáxias, “você pode usar a toalha como agasalho quando atravessar as frias luas de Beta de Jagla; pode deitar-se sobre ela nas reluzentes praias de areia marmórea de Santragino V, respirando os inebriantes vapores marítimos; você pode dormir debaixo dela sob as estrelas que brilham avermelhadas no mundo desértico de Kakrafoon; pode usá-la como vela para descer, numa mini jangada, as águas lentas e pesadas do rio Moth; pode umedecê-la e utilizá-la para lutar em um combate corpo a corpo; enrolá-la em torno da cabeça para proteger-se de emanações tóxicas ou para evitar olhar a Terrível Besta Voraz de Traal; você pode agitar a toalha em situações de emergência para pedir socorro. Naturalmente pode usá-la para enxugar-se com ela se ainda estiver razoavelmente limpa.” Ah! Agora 'tá explicado!