domingo, 28 de dezembro de 2014

O Velho, O Preto e a Sabiá

Naquele período, onde você aprende com seus pais o que é certo e o que é errado, eu aprendi que não era socialmente correto chamar um senhor de idade avançada de “velho”. Aprendi isso quando entrei num ônibus, com minha mãe, fiz exatamente isso e levei um “pito”, pedindo desculpas a seguir (bons tempos em que as crianças recebiam boa educação). Hoje em dia esses “senhores de idade mais avançada” são chamados de “pessoas da melhor idade”. Tudo vai mudando, para não ofender ninguém. Só que, na poesia, nem sempre isso é possível. Imagine os tradutores da obra de Ernest Hemingway colocando o título como “O senhor, na melhor idade, e a vasta extensão de água salgada que cobre grande parte da superfície terrestre”. 

O velho era muito velho. Já vivia sozinho há muitos anos, desde que sua velha partiu para lugares melhores, onde todos iremos um dia. Passava parte do mês na cidade e parte do mês na casinha interiorana, onde recebia visitas e cuidava das suas galinhas. Durante o dia, nos vários momentos de folga, ficava sentado na varanda ou, então, cochilando no sofá, quando não andava pela cidade. Gosta de doces e se você for visitá-lo, leve de figo ou de pêssego, mas ele não rejeita pudim de leite. Um belo dia, ele ficou doente (velho fica doente, não é mesmo) e não apareceu na sua varanda durante um bom tempo. 

Chamar alguém de preto pode ter um tom pejorativo. Aí, o socialmente correto virou “pessoa afrodescendente”, até que descobriram que 67,1% dos genes de Luiz Antônio Feliciano Marcondes, o Neguinho da Beija-Flor, têm origem na Europa e apenas 31,5%, na África (clique aqui para conferir). Ele é branco? E eu? Por que eu não sou “afrodescendente”? 

Enfim, lá na casa do velho tinha um preto que cuidava das galinhas, na sua ausência. Era velho, mas não era tão velho e também não era um preto velho, se bem que era umbandista, mas disso eu não sei nada direito. Muito conversador, uma barriga invejável e, até agora, não sei como ele conseguiu passar pelo alçapão que dá acesso ao forro da casa, onde ele lavou a caixa d'água. Quando ele chegava perto das galinhas, elas já sabiam que era o horário da comida e iam na sua direção (com o velho era a mesma coisa). Eu também cheguei perto do galinheiro, mas as galinhas não vieram na minha direção. Ficaram imóveis, como se alguém tivesse gritado “estátua”, que nem naquela brincadeira infantil, lá do meu tempo. 

Sabiá é um pássaro, mas também é personagem da “Canção do Exílio”, de Gonçalves Dias. Além disso, é nome da música vencedora do III Festival Internacional da Canção em 1968. Recebeu uma vaia enorme porque o público queria (queria?) “Caminhando” do Geraldo Vandré. Várias outras músicas falam do pássaro que é bem interessante. 

Lá na casa do velho, onde também tinha o preto, uma sabiá (para concordar com o Chico Buarque) chegava na janela da copa e ficava batendo, com o bico, no vidro da janela. Servia para me acordar, pois mantinha o mesmo horário, logo com os primeiros raios do sol. De tarde voltava e até em outros momentos. Disseram que ela fazia isso porque via seu próprio reflexo e pensava que era outro da mesma espécie. Ah! Que falta de poesia! Tenho certeza que a sabiá só fazia isso para ver se o velho aparecia, quando ela voava de novo. Se as galinhas reconhecem aqueles que as alimentam, claro que a sabiá também reconhece seus vizinhos. 

Aí o velho ficou bom da doença (foi coisa rápida), mas andou debilitado e passou mais tempo na casinha do interior. As galinhas ficaram contentes, o preto teve com quem conversar e a sabiá voltou a chamar na janela. 

Bons momentos de cidade do interior...  

"Não permita Deus que eu morra 
Sem que eu volte para lá 
Sem que desfrute dos primores 
Que não encontro eu cá 
Sem que ainda aviste as palmeiras 
Onde canta o sabiá"  





Boa Tarde! Eu sou o Narrador.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Entre Tartarugas, Golfinhos, Pássaros e Tubarões

”Os passageiros sentados à esquerda do avião estarão vendo Noronha, durante nosso voo panorâmico, antes do pouso; os passageiros sentados à direita estarão vendo os passageiros da esquerda vendo Noronha.” 

Chegar ao arquipélago é uma sensação indescritível e a “zuera” já começou no voo com as informações do comandante. É interessante ver as pessoas desembarcando, muito animadas e sem ter a menor ideia do que vão encontrar pela frente, enquanto os que vão embora estão francamente exaustos, mas certamente satisfeitos. Particularmente eu pensava que encontraria algo mais rústico, tipo Ilha da Fantasia, com o Tattoo e o Sr. Roarke nos esperando, mas encontrei um receptivo muito organizado, com ônibus com ar condicionado, e cumpridor de todos os horários. Só que antes de encontrar nossos recepcionistas, preenchemos nossa ficha, no melhor estilo “Big Brother”, e passamos à categoria de monitorados durante toda a estadia; nossa individualidade fica entregue aos roteiros e mesmo aqueles que seguirão por conta própria terão suas fotografias aparecendo nos computadores presentes nos acessos às praias. O contato com o mundo exterior é bem restrito, já que não há WiFi com facilidade, o 3G ainda é projeto e o celular só pega em alguns locais. Considerando tudo isso, o que importará é a felicidade de interagir com a natureza sem a menor possibilidade de resolver alguma coisa que surja lá de onde você veio.

Fiquei no Sueste, uma linda praia de águas calmas e cristalinas, onde existe um ponto de apoio para o turista comprar o cartão de acesso ao parque (necessário para quase tudo e é complementar à taxa de preservação ambiental que você paga no aeroporto ou, antecipadamente, pela Internet). Nesse ponto de apoio você também encontra água potável, mais em conta, se você tiver um squeeze para abastecer (pode comprar um lá também). Vale muito a pena e essa iniciativa reduziu em mais de 60% o lixo gerado pelas garrafas pets. Na praia do Sueste você pode fazer um passeio no mar, naturalmente com equipamento de mergulho e colete, onde você é rebocado por um guia e observará, com segurança, muitas tartarugas, muitos peixes e até um ou outro tubarão. Diz a lenda que não há qualquer registro de ataque de tubarão a seres humanos na ilha, se bem que nem todo mundo que é atacado por um tubarão volta pra contar a história (segundo um dos diversos pesquisadores que ministram palestras, interessantíssimas e imperdíveis, na sede do Projeto Tamar – a “zuera” continua até nas palestras). 

Noronha possui diversos atrativos que modificam dependendo da época do ano e é importante o turista pegar essas informações; efetivamente não é um roteiro estável e se a pessoa não programar muito bem, corre o risco de não gostar (principalmente se for um chato!). Fiz passeios básicos, com caminhadas leves (mas descobri mais alguns músculos desconhecidos mesmo assim), e bem completos por conta do guia que nos levou no chamado “Ilhatur” (não vou dar muitos detalhes porque tudo é “encontrável” na Internet – pesquise antes, pois lá a internet rápida é mais lenta que um modem de 28kbps); na sequência veio o passeio de barco que é acompanhado, em parte, pelos golfinhos rotadores e essa é a melhor parte do passeio. Existe um mirante para observar o descanso dos golfinhos também, mas, infelizmente, não os avisaram que iríamos lá e só valeu pela vista mesmo. Por último, veio um passeio pelo centro histórico, onde fica um grande reparo, pois não há qualquer conservação razoável do pouco que sobrou das construções. 

Apesar de paisagens fascinantes, a impressão que tive é que tudo vai acabar por conta da degradação ambiental. Por mais que os pesquisadores se esforcem, a destruição começou no passado com a introdução de espécies exóticas como o “mocó” (uma espécie de preá que era usado para “tiro ao alvo”, porém eles reproduzem muito rápido e se alimentam de cascas de árvores, contribuindo para o desmatamento), assim como um lagarto de hábitos diurnos que foi introduzido para comer ratos e sapos (que possuem hábitos noturnos) e encontrou alimentos nos ovos das tartarugas, e outras espécies da flora e fauna. Uma coisa é boa: não existem cobras na ilha (mas existem mosquitos e o repelente faz parte do arsenal do turista, assim como o filtro solar). 

Em muito pouco tempo você vira “morador”: rapidamente descobre o trajeto do ônibus, descobre onde comer gastando menos (mas tudo é caríssimo, não se iluda), conhece vários estagiários voluntários (que passam lá de dois a seis meses – se o leitor é estudante de biologia, turismo e afins, vale a pena conferir o site do ICMBio), além de outras coisinhas que tornam a visita mais interessante. 

Algumas dicas: 
- O lance do squeeze é bem legal. 
- Geralmente às segundas e quintas, na praia do Sueste, os biólogos do ICMBio fazem a “captura intencional da tartaruga”, para marcação e estudos, e isso é aberto ao público. 
- As palestras na sede do ICMBio são diárias e é um ótimo programa para iniciar a noite. Ao lado existem dois restaurantes que buscam você na pousada e depois levam de volta (desde que você jante por lá). 
- Se você for à praia da Atalaia, pesquise antes, pois é necessário agendar e você deve usar uma vestimenta com fator de proteção solar, além de outros equipamentos de mergulho (se for o caso). As blusas com FPS 50 são fáceis de achar em Noronha e não são caras. 
- A melhor “lojinha de lembrancinhas” (se é que vai sobrar dinheiro pra isso) fica na única farmácia local que é próxima do Restaurante Flamboyant, onde há buffet a quilo (100g custam o mesmo que 1 litro de gasolina – preço Noronha). 
- À exceção do passeio de barco tradicional, use tênis em todos os outros e leve o chinelo na mochila. 
- Para quem vai sozinho, contratar um pacote e um receptivo pode sair mais em conta do que fazer tudo “na unha” 
- A “zuera” faz parte do passeio.  


Boa Noite! Eu sou o Narrador.

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

When You Wish Upon a Star

Passei vários dias sem acesso à Internet, com telefone limitado a alguns locais e isso foi ótimo. É aquela sensação de que nada disso faz falta, que são somente instrumentos facilitadores e que você vive sem eles sem grandes dificuldades. O único problema é que programei um texto para o dia quinze, falando do Walt Disney, que morreu em 15/12/1966, mas ai não teve jeito, pedi mais uma cerveja, e vou mandar o texto hoje mesmo. 

Esse ano, que já vai terminando (e que já vai tarde), foi marcado pela morte do Roberto Bolaños, criador do Chaves e do Chapolin, e houve uma comoção muito grande nas redes sociais, citando que ele fora o ídolo da infância de muitos o que me fez lembrar dos meus ídolos infantis. Além do tradicional “Sítio do Pica Pau Amarelo”, meu primeiro contato com a fantasia veio justamente dos chamados “filmes da Disney”, como Branca de Neve, Cinderela, Pinóquio e o grande clássico Mary Poppins, que outro dia é que eu fui saber (vendo um filme também da Disney) que era baseado em livros infantis e que deu muito trabalho para virar filme (sua autora, P.L. Travers, não gostava das coisas do Walt Disney, achava algo mercantilista demais para o gosto dela). Um detalhe interessante é que descobri que o Disney era um homem quando ele morreu; eu achava que era outra coisa, sei lá bem o que, mas recebi a explicação quando, nas revistinhas do Pato Donald, Mickey, Tio Patinhas, apareceu o desenho dele, com seus personagens chorando, e um texto do Victor Civita, dono da Editora Abril, que distribuía as revistinhas, lamentando a perda. 

Aprendi a ler muito cedo e tenho certeza que os quadrinhos ajudaram no meu gosto pela leitura. Adorava o Tio Patinhas e aquela piscina de dinheiro; o Manual do Escoteiro Mirim era sonho de consumo até que, um dia, ele foi editado e vendido nos jornaleiros. Junto com essa fantasia toda, claro que havia a Disneylândia e a viagem até lá, com a “Vovó Stella” ou, mais adiante, com a “Titia Augusta”, era o desejo de toda criança daquela época. No meu caso não rolou e troquei essa ideia pelo Parque do Beto Carrero, mas também só fui lá na idade adulta. 

Hoje a antiga Disneylândia mudou muito, tem outros parques associados, mas a fantasia continua por lá. Mercantilismos à parte, o que interessa é que tudo começou na cabeça do Walt Disney e a inesquecível música do filme Pinóquio é a minha contribuição para marcar o aniversário da morte de um grande sonhador. Se eu ainda vou “na Disney” algum dia? Nem imagino, mas quando eu for eu conto aqui, afinal... “Se você pode sonhar você pode fazer”!



Boa Noite! Eu sou o Narrador.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

O Pedal e o Descobrimento

Escrever dois textos no mesmo dia seria arriscado se o objetivo do blog fosse outro que não o meu prazer na escrita. Claro que meus quinze leitores fixos são importantíssimos e hoje terão um pouco mais de trabalho, assim como os leitores eventuais. 

Quando a gente entra de férias geralmente temos alguma programação, além de acordar mais tarde e não ter muita hora para nada. Eu continuo acordando cedo e evito o ócio de alguma forma. Verificando o tempo livre, aceitei a proposta de Alice e parti pra Joinville no último final de semana. Geralmente minhas visitas incluem umas comprinhas, um cineminha, uma saída à noite e volta no dia seguinte, mas, dessa vez, resolvi procurar alternativas e a amiga acompanhou minhas ideias. 

A primeira foi um passeio de bicicleta pela cidade. Sim! Bem legal, né? Só que eu não coloquei a bicicleta no transbike e percorri os cento e noventa quilômetros equilibrando a magrela. Há alguns meses eu descobri que tem um passeio promovido pelo Dr. Bike (apelido do Daniel Rodrigues) através da Pedaltur, que aluga as bicicletas. Preferi o período da tarde e, por sorte, não havia muito sol, mas o dia estava agradável. Conhecemos o Instituto Internacional Juarez Machado, o Museu Nacional de Imigração e Colonização, além de outros pontos turísticos que sempre estiveram lá, mas, as vezes, a gente esquece disso e não faz a visita. 

No dia seguinte, visitamos o Memorial do Descobrimento que fica no posto Sinuelo na BR 101, caminho para Florianópolis. Sempre tive curiosidade de conhecer, até porque essa paradinha no posto é bem típica dos viajantes, principalmente para a turma das excursões ao Beto Carrero. O local é sensacional e a réplica da caravela é muito boa, fazendo a imaginação voltar aos tempos do Cabral (o Pedro Álvares e não o outro). 

Claro que também fui aos shoppings, fotografei a decoração de Natal e ainda comprei minha agenda 2015. Para encerrar os trabalhos, jantar num restaurante árabe, com direito a danças típicas e a presença adorável da Laura. 

Para tratar o passeio de bike, o telefone de contato é (47) 99013141. O Memorial fica aberto todos os dias, desde que não chova, mas vale a pena telefonar para lá e confirmar os horários através do telefone (47) 3447.7100.  


Boa Noite! Eu sou o Narrador.

Idiocracia - O filme

No dia que completo trinta anos de formado (hoje), optei pelo descanso, mas a leitura de algumas notícias na internet coincidiram com um filme passado no canal "FX" de forma muito interessante. Na Folha de São Paulo, a notícia era que a “Prefeitura de SP aprova aluno com nota vermelha”; no blog Maternar lemos que “Na contramão, parques de SP proíbem até bicicletas de crianças”; no Diário Catarinense, “Vídeo de bebê que não deixa a mãe dormir viraliza nas redes sociais”; ainda na Folha, “Juiz perde voo e dá voz de prisão a funcionários da TAM no Maranhão”

Considerando que essas notícias já fizeram a segunda-feira meio difícil, preferi ver/assistir um besteirol na televisão mesmo, como já falei antes. Calhou de ser o filme “Idiocracia” ("Idiocracy"), produção de 2005/2006, onde seu produtor/diretor Mike Judge (criador de Beavis and Butt-Head), segundo a Wikipedia, “escreveu Idiocracy como um meio para cumprir o seu contrato de dois filmes na "20th Century Fox" e encontrar um local para expressar seu ponto de vista sobre a trajetória da sociedade estadunidense. Imaginado como um "2001 que deu errado", onde a sociedade piorou em vez de melhorar.” O filme nem foi lançado, ficou escondido e, nos poucos lugares que apareceu, nem houve promoção (foi algo do tipo “cumprir tabela”), sendo uma das piores bilheterias de todos os tempos. 

Realmente, como filme, ele é péssimo e a única coisa que presta é a narração que explica toda a evolução durante os anos. Imagine o tema clichê da experiência de congelamento, que duraria pouco tempo, mas, por motivos diversos, ela é esquecida, o sujeito fica congelado quinhentos anos e surge numa terra destruída, não pela hecatombe nuclear e sim pela ignorância dos seus habitantes. Nesse futuro, ele faz um teste de QI, onde a pergunta é ridiculamente fácil e ele é considerado o humano mais inteligente do mundo. 

Algumas pérolas como “os cientistas ficaram mais preocupados na produção de produtos para alisar o cabelo e produtos para melhorar a ereção”, a água potável substituída por um isotônico/energético (usado, inclusive, para irrigar as plantações que, naturalmente, não produziam nada), a mudança na linguagem para o uso excessivo de gírias e merchandising, além de uma baixaria sem tamanho, deram o tom de “humor negro” ao filme (a hecatombe nuclear seria um destino melhor para a humanidade). 

Durante toda minha carreira, eu tive que estudar muito. Antes, ainda no colégio, os professores eram rigorosos, a média era alta e se não houvesse esforço, o resultado era reprovação mesmo. Fui educado no tempo em que "passar de ano" não era motivo de comemoração e sim de “não fez mais do que a obrigação”. Obrigação? Claro! Estudar é a obrigação infanto juvenil, antes de virar força de trabalho, quando outras vão surgir. Aprendendo, desde cedo, o jovem chega na faculdade com esse bom hábito e, depois, continuará estudando, para passar nos concursos e conseguir encarar o tão difícil mercado de trabalho. Quando tiramos essa obrigação das crianças, já que "passarão de ano" mesmo sem a nota necessária, não podemos acreditar que elas chegarão na idade adulta capazes de sobreviver sozinhas e viverão às custas do assistencialismo. Claro que criança deve brincar também e chega a ser surpreendente isso não acontecer nos parques públicos. Melhor o vídeo game? Vamos combinar né! 

Ah! Uma coisa interessante também (que hoje é uma queixa frequente por ai): dormir é um privilégio dos solteiros sem filhos. Já diziam os meus mais antigos, que devemos aproveitar para dormir tudo que temos direito antes deles nascerem, porque depois eles serão pequenos e levantaremos várias vezes durante a noite; quando crescerem, a coisa piora muito, pois estarão nas festas dos amigos, terão carros e, um dia, nos darão netos, onde o ciclo recomeçará. 

A reportagem sobre o a prisão dos pobres funcionários da empresa aérea dispensa outros comentários, mas vale a pena conferir a tirinha do Porco Espírito a respeito. Os links para as matérias, assim como para a tirinha, estão “coloridos” como expliquei em outro texto. Quanto ao filme, vale a dica... é interessante pensar nessa possibilidade, pois não estaremos lá, mas nossos descendentes estarão. Que tal evitarmos isso (a hecatombe nuclear também deve ser evitada)?


Boa Noite! Eu sou o Narrador.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

O Dia Que Mataram o Narrador

”Era uma vez uma linda donzela, que vivia na favela do Atirado. Ela sonhava em encontrar seu "Belo Encantado", mas não sabia muito bem para qual Bangu ele havia sido transferido. Até que um dia... Aaahhhhhhhh...
 - Ei, Narrador. Narrador acorda! Não faz isso comigo, Narrador! Ah, não acredito! Quando finalmente raiou o tão esperado “até que um dia...” o Narrador me bate as botas.” 

- Calma, Dona Natasha! 
- Ana Paula, por favor. 
- OK, Dona Ana Paula. O que o Narrador fazia na sua casa lá na favela do Atirado? 

Há alguns anos atrás, cansada de ser sacaneada pelo Narrador e seus textos, Ana Paula não resistiu e sequestrou o sujeito. Submetido à torturantes sessões de música sertaneja, ele finalmente resolveu quebrar o galho e tentou um texto mais bacaninha e essa história foi contada em outro blog, por outro escritor. O grande problema, que resultou na sequência dos eventos relatados, é que ela não gostou do nome do escolhido, já que o lance dela era sertanejo universitário e não pagode. Além disso, de donzela ela não tinha era nada. 

- Isso já é mais difícil de explicar, delegado. Dá pra pular essa parte? 
- Hum... por enquanto, talvez. Nesse momento entraram os policiais e aí o que aconteceu? 

Ana Paula seguiu seu relato, tentando resumir a situação.

- Foi uma confusão danada. Mandaram todo mundo para o chão, apesar que “todo mundo” era só eu mesma, já que o Narrador estava lá, jogado no assoalho (imundo) do barraco. Com muita discussão, resolveram colocar o corpo do pobre coitado na mala de um fusca, pois falaram que bastaria "usar uma chave sextavada e tirar o pedal que caberia sem problemas". O que realmente aconteceu, é que quem escreveu o texto original, ficou sem ideia e resolveu mudar o rumo da prosa. 
- Como assim, Dona Natas... digo... Ana Paula? Rumo da prosa? 
- Sim! Na versão original!
- ??????

“- Narrador! Você não morreu?! 
- Na verdade sim, mas esse escritorzinho mixuruca não estava encontrando um jeito de continuar a história sem mim! - disse o Narrador, em claro ato de insubordinação. 
- Que ótimo. Eu também não vivo sem você. Desde que eu nasci, você vive me dizendo o que fiz, faço ou farei! 
- É para isso que servem os narradores de contos de fadas!” 

- Mas a senhora não falou que ele vivia te fud... digo... escrevendo contos depreciando sua moral? (uma gargalhada enorme ecoou no salão, onde vários outros policiais conversavam). Cala a boca, piazada! - ele gritou - Pode continuar, Dona Ana Paula. - disse o delegado, pouco entendendo do que ela estava contando (da mesma forma que o leitor).

“Então, num súbito ato de bondade, o escritor (do outro blog) coloca um portal de outra dimensão nessa história, para o qual Ana Paula e o Narrador correram freneticamente, sob o olhar catatônico dos policiais, quando o improvável aconteceu: 

- Narrador, o que é isso? Que coisa esquisita é essa? Parece que eu estou surfando e... 

Então ela se deu conta. Esforçando-se para compreender aquela situação muito além da própria imaginação, viu-se diante do improvável.” 

- Dona Natasha! Para de enrolar! 
- ANA PAULA! MEU NOME É ANA PAULA, PORRA! (outra gargalhada ecoou, agora vindo das celas, onde vários presos observavam a movimentação). 

“ Ela percebeu que estava presa no Google! Que?! No Google, o portal de internet. 

- Não foi isso que eu pedi! Eu, o Narrador, queria um portal de outra dimensão, tipo daqueles que você entra no armário e vai parar em Nárnia! 
 - Narrador, Narrador... Olha só o que sua insubordinação nos causou, Narrador! 

No início, tudo era esquisito. Visitaram o Orkut (na época não existia o Facebook), pulando de perfil em perfil, machucando o rosto dos usuários. Depois foram parar no You Tube, copiaram e descolaram uma pipoquinha do Google Imagens e viajaram o mundo pelo Google Earth, quando, então, cansaram. 

- Ai, Narrador. Estou cansada. Meus pés estão me matando. Minha cabeça está doendo. Essa história não poderia ter sido mais tradicional? 
- A culpa não é minha. Reclama pro outro que está escrevendo essa sandice! 

Decidiram voltar. Clicaram em “sair” no Orkut, deslogaram do You Tube, abriram o Google Earth, digitaram Rio de Janeiro e pularam sobre a favela do Atirado.” 

Só que caíram mesmo foi em Guarapuava, justo na delegacia 

“- Que palavreado indigno para uma donzela. Vai pro Rio de Janeiro, lá para Bangu! 

O Narrador foi poupado, pela sua idade avançada. 

- Deixa esse velhinho gagá aí. 

A linda donzela passou 15 anos presa por desacato à autoridade, tentativa de fuga ultradimensional e um homicídio. 

- Homicídio? - perguntou o Narrador, insubordinando-se novamente. – Mas eu não morri. 

Em Bangu ela encontrou seu Belo Encantado, que morreu de amores por ela – eis o real homicídio. Houve outro crime, como uma música dele para ela, que fala algo sobre “mel, sua boca tem um céu, e com esse hálito não dá, mas eu queria te beijar”

- Narrador estúpido, “sua boca tem um mel e melhor sabor não há, que loucura te beijar”. 
- Foi o outro que escreveu isso, Natasha! 
- ANA PAULA, CARALHO! 

Por fim, segundo o escritor do texto original, Narrador agradeceu-a por gravar esta música-chiclete em sua memória e, lamentando-se por isso, informou que ela e seu Belo Encantado viveram felizes para sempre.

Achou o texto esquisito? Sem dúvida o original é muito mais divertido e você pode conferir em “Klaustrofobias”, clicando aqui. Há muito tempo eu queria fazer essa versão e hoje saiu. Ah! Como isso é uma versão livre, parte copiada e colada (entre aspas) e não autorizada, Ana Paula não está presa e vai aparecer num outro texto, mais tradicional, por aqui mesmo! Isso se eu não for processado pelo dono do original!  

 
Boa Noite! Eu sou o Narrador.