sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Atendimento Preferencial

”Os lugares mais sombrios do Inferno são reservados àqueles que se mantiveram neutros em tempos de crise moral.” 

No primeiro dia útil depois do Natal, o sujeito acordou cedo e foi resolver uma pendência simples, numa loja de uma prestadora de serviços públicos. O sol brilhou cedo e o calor de verão já era sentido mesmo às oito horas da manhã. Caminhou até a Praça Saens Pena, onde pegou o metrô, felizmente vazio, e saltou, duas estações depois, na Praça Afonso Pena. A Tijuca é um bairro do Rio de Janeiro que ainda conserva algumas tradições dos anos 1970, como os prédios baixos, com árvores nas calçadas, e a região da antiga pracinha leva qualquer um ao passado. 

Caminhou uns 10 minutos e, finalmente, chegou à loja da prestadora. Prontamente atendido, recebeu a senha N007 o que o satisfez, já que o N004 já estava em atendimento. Escolheu uma cadeira logo atrás de um homem que dormia; parecia cansado, barba por fazer e seu aspecto era intrigante. A seguir entrou outro homem com dois celulares, um tablet, com jeito apressado e suando bastante, que recebeu a senha N008. Aborrecido, sentou noutra fileira e ficou mexendo nos brinquedos que levara. 

O sujeito, então, percebeu que a letra antes da senha tinha um significado: uma senhora com uma criança de colo, foi chamada a seguir pela senha P001 o que causou alguma revolta no homem apressadinho. 

- Inferno! 
- Ah! O senhor também leu? - o sujeito tentou ser simpático, mas foi ignorado pelo homem. 

Sentindo que a coisa poderia demorar, resolveu continuar o livro que começara há alguns dias. Faltavam umas 120 páginas e, como estava confortavelmente instalado e o ar condicionado funcionava como no Ártico, achou que poderia adiantar a leitura. 

Logo a seguir, entrou uma senhorinha, daquelas bem arrumadas e cheirosas, tipicas da Tijuca, que foi chamada a seguir da P001, pois tinha a senha P002. Concluiu que o “N” significava “normal” e o “P” “preferencial”. Realmente uma boa codificação, já que temos que priorizar os idosos, as gestantes, mães com crianças de colo e ter alguma paciência porque supermercado, banco, consultório médico e prestadora de serviços públicos são locais onde não adianta ter pressa. 

Algum tempo depois, absorto pela leitura, resolveu dar uma olhada no monitor: o N005 estava em atendimento e a fila do “P” já estava no P022. A prestadora possuía 10 box de atendimento, mas somente um funcionário dai a demora. Ele entendeu e retornou à leitura, interrompida pelo movimento do sujeito dorminhoco que acordou, abriu sua mochila e tirou de lá uma escova de dentes e um barbeador, dirigindo-se ao atendente, que fornecia a senha, que indicou o banheiro. 

Faltando menos de 30 páginas, um ônibus de excursão parou na porta e 42 “senhorinhos” e senhorinhas entraram para pegar a senha. O homem que dormia, agora devidamente higienizado, foi chamado, ficou satisfeito, e ele seria o próximo. Só que, com a entrada das pessoas do ônibus, isso poderia demorar muito. Para sua sorte, aquele apressadinho que falei antes, ao ver que não trouxera escova de dentes e barbeador, deu um piti infectado e rolou no chão em convulsões. A fila parou, foi uma grande confusão, o sujeito, que acabara de terminar o livro, foi atendido e liberado porque seu problema era simples de resolver. O SAMU chegou, levou o convulsivo e depois ele não soube mais nada. 

Seguiu pela rua, pegou o metrô de volta, entrou num restaurante e ligou para seu pai. 

- Ei pai! Resolvido e agora vou almoçar... não, não é jantar não... é almoço mesmo. Ah! O livro é ótimo e terminei também. Correu tudo bem! Sim, depois te empresto e você vai gostar porque é ação o tempo todo, muita "mentirada" também, mas fala de umas coisas bonitas lá da Itália, uns museus, monumentos, tudo de bom... sim... então tá, depois a gente se fala.  


Boa Noite! Eu sou o Narrador.

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

Gordices de Final de Ano

Totalmente bêbado, o peru chega na festa dos bichos, onde já estavam o quati, o porco, o frango, o tucano e um galo que cacarejava como uma sirene dos bombeiros. 

- Então, peru? - perguntou o porco – Já pronto para a degola? 
- Nem pensar! Eles escolheram outros bichos, daqueles que nunca ninguém viu, e este ano eu escapei... ai resolvi comemorar tomando umas lá no boteco! 

As festas de final de ano possuem diversas conotações, de acordo com as crenças de cada um: pode ser um momento de reflexão, de pedidos, de distribuição de presentes (onde entra o Papai Noel) e também de celebrações religiosas. Independente do que cada um pense, o que é certo é a ceia natalina e o “enterro dos ossos”, no dia seguinte. Famílias e amigos se reúnem e comemoram da forma que melhor se encaixar em suas crenças e a comilança é diversificada.

Em algum lugar perdido por ai, os Adams elegeram Wednesday (Vandinha) como responsável pelo “enterro” já que essa atividade ela bem que gostava. Na festa dos bichos, o peru era o convidado inconveniente, já que tomara todas. 

- Ei quati! Você fez doce? É pavê ou “pacumê”? 

Quase que o aborrecido quati deu a tal resposta padrão aos chatos que não vou reproduzir aqui. Encarregou o galo “sirenista” de dar um fim ao peru. Ele foi lá fora, deu a tal cacarejada e o porco falou: 

- Olha lá, peru! Tem incêndio lá fora! Vai conferir. 

Ao abrir a porta, para ver o que se passava, o porco meteu-lhe um chute na bunda e nada mais restou ao peru que retornar ao seu poleiro, lá na casa dos Adams. 

Também no Natal, eu tenho a oportunidade de passar de novo pela montanha. É uma passagem rápida para recordar os bons tempos, ver como estão os lugares onde passeei de bicicleta e deixar a saudade aparecer de novo. Já em família, independente do que será servido na ceia, a sobremesa fica por conta do meu irmão, com uma receita antiga da minha mãe que, este ano, foi compartilhada na rede social. 

Ainda bem bêbado, o peru errou a porta do galinheiro e foi parar na cozinha, onde Wednesday dava as instruções aos cozinheiros. Achando que estava entre seus amigos, o peru mandou um “gluglu” inconveniente para a menina que, para seu azar, ela entendeu: 

- E ai, Vandinha? E os namoradinhos? 

Por conta dessa divulgação da receita, resolvi fazer este texto, já que o quati saiu das minhas costas (qualquer hora eu explico isso, se é que ainda não expliquei) e deixar, para o leitor, uma foto explicativa com o “antes, durante e depois”. 



- Ei Narrador? - perguntaria a Fada dos Olhos – o que aconteceu com o peru? 

Lá na casa dos Adams, Mortícia vai até a cozinha a tempo de se orgulhar com a habilidade de sua filha. Mal o peru terminou de “gluglurejar”, Wesnesday lançou um cutelo na direção de seu pescoço e falou para os cozinheiros deixarem o tender de lado que o almoço seria a ave mesmo, que já estava bem temperada e ficaria pronta mais depressa.  

Boa Noite! Eu sou o Narrador.

domingo, 1 de dezembro de 2013

Então é Natal!

Apesar da lenda dizer que a montagem da árvore de Natal deve acontecer no primeiro domingo próximo ao dia 30 de novembro, há mais de um mês que a decoração natalina já toma conta das ruas e shoppings. O comércio pega carona da época de magia que cerca o mês de dezembro e antecipa o início do sonho. 

Mas será que alguém ainda acredita em sonhos? Imagine então uma cena que já descrevi uma vez: se conseguir, quem sabe o Papai Noel apareça na sua casa a qualquer hora não é mesmo?

Dia primeiro de dezembro, Ana e Adrielle pareciam formiguinhas andando de um lado para o outro, subindo no armário atrás de uma antiga caixa, onde algumas coisas importantes seriam usadas. Espalharam tudo pelo chão para observar melhor. 

- Hum... este ano a árvore foi restaurada, então a coisa será um pouco diferente... mas precisa esse frio todo, Adrielle? 
- Ah! Não enche Ana! Natal é frio mesmo e isso é só para dar um clima. 

Depois de observar um pouco, amoras vermelhas foram miniaturizadas e unidas num colar; caixinhas foram enfeitadas com papel brilhante e lacinhos, e um frasquinho com a luz dourada das estrelas e o brilho da lua foi usado para pintar algumas bolinhas de sabão. Tudo pronto, elas resgataram um poema de um Natal passado e deixaram perto da árvore; antes que fossem vistas, sumiram num raio de luz.

“Acreditar cegamente no que se vê, 
Antonímia do impossível revelado ao sentimento. 
Acreditar no que sonhas enquanto acordado, 
Aquilo que não consegues tocar. 

Acreditar no que não aconteceu, 
Naquele plano surpreendente que virá. 
Acreditar na confiança que pediste, 
Quando a obviedade mostrava outra coisa. 

Acreditar que o engano é que era mentira, 
Pois a verdade era segredo de estado. 
Acreditar que o Natal trará presentes, 
Num Ano Novo juntos finalmente. 

Acreditar... verbo dos tolos? 
Que assim seja, tolo eu que amarei eternamente, 
Não me arrependerei disso em dia algum, 
Pois acreditarei em ti pra sempre!” 

E você já montou a árvore de Natal?

 Boa Noite! Eu sou o Narrador.

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

João Saldanha - o filme

O mês de novembro foi muito complicado, cheio de tarefas insanas, muitas mudanças e quase passa em branco sem qualquer texto. Claro que bons momentos surgiram, principalmente na lua cheia, quando pude curtir esse espetáculo com os antigos aprendizes e a Fada dos Olhos, lá pros lados do Costão. 

Enfim, consegui um assunto para não decepcionar meus 14 leitores assíduos: hoje vou falar de um filme/documentário que assisti ontem. Produções nacionais não são minhas preferidas: assisti “Tropa de Elite”, “Cazuza”, os filmes falando do Renato, mas nada disso me impressionou muito. Gostei mais do filme da Zuzu Angel, porque esclarece coisas que ficaram muito sombrias no passado, quando eu era muito novo. 

Com a tecnologia, as notícias chegam rápido e em várias versões (boa parte delas é falsa); antigamente, porém, as notícias chegavam muito devagar, a televisão era em preto e branco e havia a repressão ditatorial. Muitas histórias ficaram perdidas e, aos poucos, surgem sob a forma de documentário. Fuçando o Canal Brasil, apareceu o nome do João Saldanha e fui conferir. Saldanha era um cara polêmico que levou a Seleção Brasileira à Copa de 1970 e depois foi substituído por Zagallo (aquele do “Vocês vão ter que me engolir”). Criou frases (a mais interessante foi o tal do “longo e tenebroso inverno”), era “brigão” e só não foi para a Copa porque disseram que ele queria colocar o Tostão como reserva do Pelé. Só que a verdade não foi bem essa e vale a pena conferir o documentário. 

Numa mistura de futebol com ditadura militar, tudo ficou muito bem feito e esclarecido e essa é minha dica para historiadores e futebolistas.  

 Boa Tarde! Eu sou o Narrador.

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

O Enigma

Por via das dúvidas ela resolveu dar uma “faxinada” na casa. Aquela amiga bonitona, que passou a sair com seu ex-pretendente (aquele que desdenhara), viria mais tarde para se arrumar, já que teria uma festa a fantasia e o modelo “bruxinha” era o ideal para a ocasião (“essa cobra ainda vai contar vantagem das saídas com ele” - ela pensou). 

Um ano se passou e ela não mais o viu. Bem que tentou uma dessas “mensagens do além”, naquele dia da nevasca, mas nem isso adiantou. Acabou ficando empregada em casa mesmo, esquentando no fogão, esfriando no tanque e pintar unhas, comprar vestidos e arrumar cabelo virou raridade, já que seu marido nunca ligou pra isso, além do fato que dormir, para ele, era mais importante do que fazer outra coisa mais interessante. 

Colocou os gatos pra fora, bem trancados no galinheiro vazio, certificou-se que não haveria qualquer peça de lego perdida pelo chão, deixou uma dúzia de toalhas no banheiro e ficou torcendo para não chover (ocasião que sempre acaba a luz). Tudo pronto, chega a “amiga”, feito o make up e a produção completa ficou inacreditável de tão bonita. Ela se foi, mas antes falou: 

- Ei! Se acabar cedo lá, de repente ainda dou uma passadinha por aqui pra te contar, viu! Tem certeza que não quer ir? 

Respondeu que não com a cabeça, para não desabar uma penca de palavrões, e sentou no sofá, para assistir televisão, o que gerou sono e acabou dormindo. Acordou às três horas da manhã com um som ensurdecedor desses carros “tunados” tocando “Thriller” do Michael Jackson. Na sequência, toca a campainha e ela logo achou que era a amiga “cobra”. Abriu e deu de cara com uma girafa.

- Posso dormir aqui essa noite? 

Achando que estava num pesadelo, fechou a porta, mas a girafa fora mais rápida e sentara no sofá. 

- Pra fora já! Você é fruto de um pesadelo! Chega! Não aguento essas meninas que todo ano vem me atormentar! 
- Que meninas? Quem me mandou aqui foi um quati. Ele disse que você poderia me ajudar. Senta que te explico. 

Já que não havia mais jeito, resolveu ouvir a girafa que explicou a situação. Umas bruxas, as mesmas que um dia deram uma dica para uma esfinge de Tebas, criaram uma charada, onde a pessoa que errasse seria transformada em girafa. Como muita gente errou, a coisa saiu do controle e os paparazzi passaram a perseguir a girafa original; o Datena e o Marcelo Rezende queriam entrevistas e até a “Playbicho” ofereceu uma grana para ela ser a capa do mês. Com tanto assédio, ela procurou o quati e ai o restante já foi explicado. 

Já comovida com o drama, a guria aceitou a missão, mas só por uma noite, já que o marido chegaria no dia seguinte. 

- Ah! Você é uma boa moça! Tive certeza disso, logo que entrei! Ei, tem comidinha ai? Eu gosto de geleia de morangos, mel, vinho, pão e queijos, você tem? 

Ela, então, preparou um lanche, no melhor estilo café da manhã. Comeram e ela perguntou: 

- E como era a tal charada? 
- Muito fácil! Era só dizer a primeira coisa que a pessoa abriu depois de receber uma visita inesperada no meio da noite. 
- Como assim? 
- Tipo: eu cheguei e fui inesperada, não foi? 
- Muito inesperada, por sinal! 
- Então, o que você abriu primeiro, já que também vim para o café? 
- Essa é fácil! Eu abri a geleia de morangos! 

Bummmm! 

Pela manhã, o marido chegou, 

- Você está meio diferente! Pera que vou descobrir o que é... hum... já sei! Essa roupa amarela e marrom e o salto alto não é isso?  


 Boa Tarde! Eu sou o Narrador.

domingo, 13 de outubro de 2013

A História do Agapanto

E num dia de profunda inspiração, as flores foram criadas, com suas cores, seus perfumes e suas antenas repletas de pólen que seria transferido para outras flores com o poder dos pequenos insetos. Para comemorar tão importante criação, uma estação do ano foi destacada para o evento: nesse dia foi criada a Primavera! 

Num outro dia, já na mão dos estagiários (que sempre levam a culpa), sem grandes inspirações, foram criados os dias secos e a poeira, que também levaria o pólen, na falta dos insetos: nesse dia foi criado a rinite. 

Agapanto é um lírio, também chamada de “flor do amor” e foi a primeira planta primaveril interessante que consegui achar por aqui. Primeiro vi uns galhos (eu achava que eram galhos, mas depois entendi que eram hastes) e mais adiante surgiram coisas azuis que deveriam ser as flores; fotografei e guardei um tempinho para pesquisar o nome. Aí começou o problema: ainda não inventaram um mecanismo de pesquisa onde você coloca uma foto e aí surge a informação; tive que usar muita criatividade e a ajuda de amigas, especializadas em botânica, para não falar besteira.

Bom... eis que, de repente, entra pela janela uma gigantesca curucaca trazendo uma carta dos estagiários revoltados com o que consideram “perseguição”. Na carta esclareceram que a “rinite” de Primavera foi criação de umas bruxas que, atualmente, moram no Museu do Mar lá de São Francisco do Sul. Diz a lenda que uma guria desejava saber quem era o amor da vida dela e, assim, elas criaram uma poção com hastes de agapanto que, jogada ao vento, faria todo mundo espirrar, à exceção do escolhido. A coisa deu tão certo que, obviamente, saiu do controle e o que tem de guria que aprendeu a tal poção e sai jogando por ai é algo impressionante. No final da carta, eles ameaçam uma paralisação com pessoas mascaradas, mídia alternativa, xingamentos ao governador, mas prometem não depredar nada. 

Pode uma coisa dessas?  


 

 Boa Noite! Eu sou o Narrador.

domingo, 6 de outubro de 2013

Cartas para Julieta

"Querida Claire. ‘E’ e ‘se’ são palavras que, por si, não apresentam nenhuma ameaça. Mas, se colocadas juntas, lado a lado, elas têm o poder de nos assombrar a vida toda. E se… E se… E se… Eu não sei como a sua história terminou, mas se o que você sentia naquela época era verdadeiro amor, então nunca é tarde demais. Se era verdadeiro então, por que não seria agora? Você só precisa de coragem para seguir seu coração. É difícil imaginar um amor como o de Julieta, um amor que nos faça abandonar entes queridos, que nos faça cruzar oceanos. Mas eu gostaria de acreditar que se eu um dia sentir esse amor, terei coragem de persegui-lo. E, Claire, se não o fez naquela época, espero que ainda o faça um dia. Com todo amor, Julieta." (Cartas para Julieta – 2010) 

Julieta nasceu em Verona em 1930... 

- Narrador, você pirou de vez. Até eu sei que ela foi personagem de Shakespeare lá de “Romeu e Julieta”. 
- Fica quieto, quati, e para de ficar “secando” o banoffe de copinho que eu trouxe da confeitaria! 

… continuando... e veio para o Brasil, com sua família, fugindo da guerra. Era uma senhorinha muito simpática e, dizem, foi professora de italiano e pianista, o que não exerce mais atualmente devido a uma artrose na mão esquerda (mas ainda toca de vez em quando). Vários filhos, outros tantos netos e bisnetos, viúva, se divertia em alguns domingos naquelas reuniões familiares, onde a pasta era o prato principal que ela fazia questão de orientar na cozinha; em outros, apesar de italiana, frequentava o restaurante alemão local (e ia sempre muito bem arrumada, como outras senhoras também o fazem aos domingos). Além de cuidar da casa e do jardim, era frequentadora assídua da agência dos Correios daquela cidade interiorana. Apesar de alguns acharem ultrapassado, ela escrevia cartas para os parentes distantes que respondiam da mesma forma; computador nem pensar, e-mail era algo muito impessoal e vamos manter o método tradicional (mas ela tinha um smartphone, presente de sua neta, “temporona”, de onze anos, onde, além de telefonar, via alguns vídeos de música clássica postados no YouTube). 

Lá um belo dia, numa dessas visitas aos Correios, o gerente da agência perguntou se ela receberia uma carta que eles não sabiam o que fazer com ela. No destinatário estava escrito: “Para Julieta, Verona, Itália”, foi selada para envio local e não havia remetente no envelope. Como ele achou que isso era alguma coisa adolescente e ele conhecia uma “Julieta” de Verona, achou interessante o assunto. 

Já acostumada a pegar cartinhas para o Papai Noel, na época de Natal, ela aceitou. Aberto o envelope, era uma cartinha de uma menina de 11 anos que pedia conselhos à “Julieta”, na esperança de conquistar seu primeiro amor que nem sabia que ela era apaixonada; ela usava um codinome “Claire”, mas deixou o endereço no corpo da missiva. A senhorinha sorriu, aceitou o desafio e lembrou que lá na cidade dela existia um grupo de voluntárias que respondiam cartas semelhantes e que se chamava “Clube da Julieta”

Claro que adequou os conselhos para a idade da menina, algo do tipo “você é nova, tem muita vida pela frente”, essas coisas, e enviou pelo correio. A menina quando recebeu, ficou tão contente que contou a história para suas amigas que, aos poucos, foram contando para outras e, no primeiro mês, o Correio recebeu mais duas cartinhas endereçadas a “Julieta”. 

O tempo foi passando e o que começou como uma distração virou mega produção: no decorrer de 4 anos, a média mensal de cartas chegava a vinte e era a hora de pedir ajuda, onde entrou aquela neta do “smartphone”. Dona Julieta contou a história, causando um grande espanto na netinha além de um enrubescimento inesperado. 

- Ai, vó! É você que respondia as cartas nesse tempo todo? 
- Sim! Você já ouviu falar disso? 
- Claro, né, vó! A primeira carta foi minha! 

Bom... segundo a bola de cristal, pesquisando o futuro, uns vinte anos e milhares de cartinhas respondidas, com auxílio da neta e de uma bisneta, depois, Dona Julieta recebeu a visita da Hebe Camargo e foi para uma festa lá no Céu!



                      
Boa Noite! Eu sou o Narrador.

sábado, 5 de outubro de 2013

Outubro Rosa

A versão Disney para o início da Primavera, principalmente no desenho “Bambi”, é algo do tipo gelo derretendo, flores desabrochando a olhos vistos e passarinhos cantando sem parar, para desespero de corujas ranzinzas. Eu sei que o Shrek mora perto daqui (umas três curvas de vento antes), mas a floresta do desenho realmente eu ainda não encontrei. 

De qualquer maneira, teoricamente, a Primavera já chegou e sai de bicicleta para tentar encontrar umas flores para fotografar, já que o inverno foi implacável, deixou frio, chuva, muitas áreas inundadas por aqui e hoje fez um belo dia de sol. 

Bom... realmente ainda encontrei inundação (apesar do nível do rio ter baixado um pouco), mas as flores ainda não apareceram. O que realmente chamou a atenção foi um colorido diferente, bem bacana, nas praças, lojas e colégios, em alusão ao “Outubro Rosa” que é a época do ano onde se faz a campanha para a prevenção do câncer de mama. 

Resolvi, então, criar uma historinha: 

Diz a lenda que, no final do inverno, duas irmãs se reúnem com milhares de fadinhas e coordenam o plantio das flores. Primeiro criam um veranico, para animar, e depois uma chuvinha para regar. Nesse ano não foi diferente, mas elas não contavam com o Rock in Rio, onde classicamente chove e vira "rockinlama", que teria a participação de uma fada cantora que, providencialmente, deixou a chuvinha, prevista para o sul, ficar por lá, virou temporal, inundou tudo e carregou as sementes. 

Um pouco desoladas, as irmãs e as fadinhas começaram tudo de novo já sabendo que não daria tempo de coincidir com a Primavera. Nisso, apareceu a Emi (A Menina das Cores) que, por sinal, fez aniversário no dia quatro ("Nossa! Como está crescida!"). 

- Meninas! Já tive cabelo rosa e sobrou muita tinta! Pra coisa não ficar em preto e branco podem usar a vontade! 

E foi o que fizeram (do jeito fada, né) e o rosa espalhou-se por todos os cantos. Agora é só esperar um pouco que logos as flores aparecerão (elas garantem isso).

  
Boa Noite! Eu sou o Narrador.

sábado, 28 de setembro de 2013

Pimentas

Acordei cedo nesse dia frio (o inverno, que dura 9 meses, continua e as flores da dita primavera ainda não apareceram) torcendo para aparecer alguma coisa de sol e andar de bicicleta (mas a previsão é de chuva, para o terror dos moradores ribeirinhos que ainda não tiveram suas casas inundadas pela cheia do rio). 

Já que isso não aconteceu e, ainda por cima, houve um apagão rápido, parti para a leitura e quase terminei o livro “Pimentas” de Rubem Alves. Esse livro “piscou” pra mim numa livraria, depois que a amiga Andréa deu a dica e acabei comprando. Iniciei a leitura numa sala de espera de aeroporto e ainda não terminei, claro: são “pimentas” e, como diz o próprio autor, “Para se provocar um incêndio, não é preciso fogo. Basta uma única brasa. Um único pensamento-pimenta...” Além de recomendar o livro, resolvi escrever aqui alguns “pensamentos-pimenta” que andaram por ai. Nessa época onde as leis são ignoradas e as pessoas fazem o que bem entendem (principalmente alguns representantes públicos), mudando a regra com o jogo em andamento, resolvi juntar algumas coisas por aqui para ver no “que que dá”. 

“Um dia frio, um bom lugar pra ler um livro.” Djavan 

"Ninguém vai bater mais forte do que a vida; não importa como você vai bater e sim o quanto aguenta apanhar e continuar lutando; o quanto pode suportar e seguir em frente. É assim que se ganha." Rocky Balboa 

"Pois é, fumar maconha não pode, mas Mensalão pode fazer de novo, né?" Samuel Rosa 

"Um problema é uma coisa que não existe: se é problema tem solução; se não tem solução não é problema, é catástrofe!" doc

“E rola?” Porta dos Fundos 

“Cada vez que ouço um discurso político ou que leio os que nos dirigem, há anos que me sinto apavorado por não ouvir nada que emita um som humano. São sempre as mesmas palavras que dizem as mesmas mentiras.” Albert Camus 

“Odeio feijoada” Porco Espírito 

“Ei Cabral! Vai tomá no cu” Público do Rock in Rio

“Quero agradecer à Antarctica pelas caixas de brahma que me mandou!” Claudiomiro 

“Confesso que prefiro a vergonha da renúncia a ter que conviver com a vergonha de ter traído a minha consciência, pois quando um indivíduo abre mão de suas convicções, perde sua identidade e o significado de sua existência” Alexandre Bley (ex-presidente do CRM-PR)

“Embargos infringentes? Que porra é essa?” Quati do Narrador 

“Onde está Amarildo?” grito popular 

“Passaram mais de 500 anos e o Brasil continua o mesmo.” Sofia Leitão

“A vida não é justa” Andréa Pachá

“A neurose é esperta e se alimenta da ansiedade e da angústia.” Alexandre 

“Fogo está extinto! ” Coronel Marcos de Oliveira 

“And all along I believed I would find you... Time has brought your heart to me” Cristina Perri

“O pra sempre sempre acaba” Renato Russo  


Boa Dia! Eu sou o Narrador.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Caverna do Dragão

Dungeons & Dragons (Caverna do Dragão) foi um desenho animado baseado no jogo de RPG do mesmo nome. Foi mais uma daquelas séries que nunca terminaram, com a diferença que essa era em desenho e que hoje passa no canal Gloob, da TV por assinatura, mas já foi hit do finado “Xou da Xuxa”. 

Interessado no assunto, o quati resolveu dar uma pesquisada, já que a coisa mais parecida com dragão que ele conhecia era um tal de “gorilão da bola azul” que não se criou lá pelas cataratas (levou um chute no saco, soltou um  puta que pariu – caralho palavrão e saiu pela porta dos fundos). 

Acabou que encontrou um final da série (em quadrinhos), mas ele achou que ainda faltaram alguns detalhes e foi consultar o “Contos de Fada?”... 

"Diz a lenda (alguns contos de fada começam assim)... 

… que houve um tempo, em outra dimensão (dessas onde o portal de acesso aparece na montanha russa de parques de diversões), que os poderosos dragões dominavam os homens, sob as ordens de feiticeiros do mal.

Um desses dragões recebeu uma missão: derrotar um cavaleiro errante que procurava sua princesa no interior de uma caverna, onde ela era cativa. Nesse dia, então, ele chegou antes e posicionou-se à frente da princesa, afim de não dar qualquer chance ao cavaleiro. 

Na espera, ela aproximou-se do dragão, deu-lhe um “olá” e acariciou sua testa, além de oferecer-lhe um chá. Vendo isso, uma lágrima ameaçou cair dos olhos da fera que foi embora sem cumprir sua missão: afinal, como poderia magoar a doce menina depois de tão gentil acolhida? 

Dessa forma, o cavaleiro encontrou sua princesa e comandaram uma batalha contra os feiticeiros que, de tão irados que ficaram, baniram o dragão para outro mundo. Foi ai que ele apareceu num parque de diversões e, quando abriu-se o portal, meia dúzia de crianças entraram e ele saiu. A garotada encontrou o Mestre dos Magos e o dragão entrou num armário e foi parar no País dos Sonhos Verdes, onde ficou responsável pela Rosa Azul."

- O que achou, quati? 
- Ah! Agora eu entendi! 

“E a brisa da Primavera já bate à janela; que ela preencha os corações de cores fortes, como fortes são os sons que vem da alma preenchendo o vazio que um dia existiu.” 


Boa Noite! Eu sou o Narrador. 

N.N.: Quem quiser ler o final da saga, pode clicar aqui e fazer o download.

domingo, 1 de setembro de 2013

Sonho de Domingo

Hoje em dia, quando a meteorologia avisa que vai chover, é melhor seguir os conselhos da sua mãe e levar casaco, capa e guarda-chuva, mesmo que o amanhecer seja com sol. 

Naquele dia, a coisa não foi bem assim: a neblina misturada à fumaça das chaminés, dava um ar bucólico ao domingo frio de final de inverno (se é que o inverno acaba por aqui). Mesmo assim ele aproveitou uma réstia de sol e deu uma volta de bicicleta, não sem antes limpá-la um pouco e encher os pneus, já que estava parada há algum tempo. Os demais acordaram acordaram tarde e o café limitou-se a um café mesmo, sem bolachinhas ou chocolate, porque já era quase hora do almoço. 

Caras de sono circularam pela casa, assim como roupões pesados e pantufas, mas domingos não foram feitos para dormir, mesmo esse que, particularmente, tinha tudo de bom para continuar na cama. Após o almoço, cada um partiu para um canto: Ana foi procurar um feitiço perdido no tempo; Adrielle foi olhar a neblina e pegou algumas nuvens para futuras referências, caso necessitasse, enquanto o Guri foi olhar a chuva que fez o dia anoitecer bem no meio da tarde... 

- Ué? De onde veio este lago? E que casa é aquela lá? 

Todos correram para ver a novidade: um antigo lago, que fora aterrado, com a chuva tomou vida e trouxe junto peixinhos coloridos que pulavam pra todo lado, vitórias-régias que serviam de pouso para algumas rãs e até um velho celacanto deu o ar da sua graça, surpreendendo inclusive o Dragão! 

O que mais os intrigou foi a casa: encravada na vegetação de tal forma, que o limite entre seu final e as árvores era francamente impreciso, da distância que estavam. Já semidestruída, dava para ver duas janelas e talvez a porta fosse nos fundos. O Mago esteve lá uma vez e contou que era habitada por um homem comum, de bom caráter, correto nas suas coisas, que diziam ser um sonhador, mas alguns achavam que era doido varrido e, claro, tinham muita inveja dele. Era um sujeito que procurava sempre a continuação de alguma coisa e pouco parava em qualquer lugar; talvez tivesse um objetivo que nem ele sabia bem qual era. Ao certo, por muitas vezes, sofreu em silêncio, pois era discreto; em outras ocasiões, foi muito feliz e hoje fica sossegado em algum lugar incerto do mundo. 

Interrompendo a narrativa, eis que as águas se elevam, como um chafariz, e no centro daquilo que parecia ter vida, uma canção ecoou vinda de um ser brilhante que apareceu do nada. 

- Fênix! - gritaram em uníssono (nesse uníssono todos participaram) 

- Da mesma forma que o lago renasceu, trouxe uma história para vocês que eu chamei de "Renascimento"... 

"Transformo-me pelo vento, 
Pela solidão que me consome. 
Quando sinto que não posso mais voar, procuro a realidade. 
Meu nascimento vem das cinzas, das tristezas dos amores não amados. 

Sou um livro aberto da história; 
Conheço cada ponto do horizonte; 
É mais do que qualquer um possa imaginar; 
As pétalas dizem que esperança está em qualquer lugar. 

O homem é um ser complexo: 
Tão delicado, mas ao mesmo tempo tão explosivo. 
Aprendemos, com os magos, a magia da vida; 
Aprendi [...] a tentar ser quem eu realmente sou... 

Sou aquela que nunca deixará de existir 
E que ao mesmo tempo sempre estará em busca de um reino,
Onde a paz é completa... 

Estou em todos os lugares onde você precisar de mim.... Sou a Fênix dos seus sonhos..." 

- Acordem crianças! Já é quase hora do almoço! 

E num lugar distante e num futuro incerto, Adrielle e o Menino encontraram com o tal sujeito, numa outra casa, de varanda, fumando uma guimba, barba por fazer, camisa aberta, bermuda e chinelo. 

- Sabia que um dia vocês me encontrariam. Acreditar que os sonhos viram realidade faz parte. Sejam bem vindos!

 
Boa Noite! Eu sou o Narrador.  

N.N: Parte dessa história foi publicada originalmente no “Contos de Fada?” em 24/04/2010 e o belo poema de Fênix ("Renascimento") é de autoria de Francyne (Nini) Félix, com permissão. A foto foi tirada na Baia da Babitonga.

terça-feira, 27 de agosto de 2013

A Ciranda do Anel

♪ ”Perdi meu anel no mar, não pude mais encontrar. E o mar, me trouxe a concha, de presente prá me dar. Uma vez chorei na praia, prá um anel que se perdeu. Meu anel que virou concha, nunca mais apareceu. Parou na goela da baleia, ou foi pro dedo da sereia,ou quem sabe um pescador encontrou o anel e deu pro seu amor.” ♫ (Bia Bedran) 

Naquele tempo, os dias não eram tão frios como agora, o computador ainda era para poucos e a Internet para menos ainda. Consequentemente, “A Galinha Pintadinha” nem no ovo estava e a gente levava as crianças em qualquer lugar que tivesse um evento infantil. Um desse foi no Shopping Tijuca, lá no início da decadência do comércio de rua, onde a apresentação era da Bia Bedran. Conhecida no programa “Canta Conto”, que passava na TV Educativa, suas músicas e histórias eram a grande pedida, na época, como alternativa na TV aberta. O mais interessante nessa apresentação é que os pais sabiam mais as músicas do que as crianças (que talvez preferissem outros programas na televisão) e o momento mais impressionante foi justamente quando ela cantou a “Ciranda do Anel”. Quem estava no primeiro andar, se olhasse para cima, de repente veria todas as amuradas ficarem lotadas de adultos, que interromperam suas atividades “shoppinianas”, para ver, curtir e cantar em uníssono. Foi uma cena inesquecível e, num dia, eu escrevi sobre a música lá no “Contos de Fada?”. Faço, agora, um remake por aqui. 

E mais uma vez... Senta que lá vem história! 

Num desses dias frios como hoje, onde o inverno insiste em mostrar a sua força (exibido) e alguns procuram a neve em algum lugar, a menina andou pela casa até encontrar um livro com antigas cantigas. Isso a entreteve por um tempo, quando, então, resolveu perguntar: 

- Por que o mar levou o anel? 
- Trocou-o pela concha e a deu de presente. Do anel, ninguém mais soube... procure a sereia, ou até a baleia, mas acredito que foi mesmo o pescador que o encontrou e o deu para seu amor... 

Insatisfeita com a resposta, ela procurou um pequeno sachet na sua mochila que exalava um perfume suave de pétalas de rosas... 

- Se é preciso um anel, farei um e o choro acabará!  

Antes que o Mago pudesse responder, ela abriu a pequena almofada perfumada e uma esfera prateada, que lá estava, flutuou ao seu comando antes de rumar às estrelas... Alguns minutos depois (seis ao todo), a esfera retornou às suas mãos, dessa vez com um brilho dourado. A menina, então, a coloca de volta à origem... 

- O que a esfera trouxe, Beatriz? 
- Só você me chama assim!  

E com seu risinho meigo, fez desaparecer o sachet no meio de flocos de neve... 

- Pronto. Agora ele não vai mais chorar. O anel irá para seu verdadeiro dono. 

O Mago, perplexo, sorriu! E em algum lugar, numa praia distante, uma longa procura terminou... 

E entrou por uma porta e saiu pela outra e quem quiser que conte outra... 

  
Boa Noite! Eu sou o Narrador.

terça-feira, 20 de agosto de 2013

A Árvore e as Estrelas

"As árvores estendem seu galhos (braços) buscando a luz das estrelas, enquanto elas próprias veem seus pontos verdes brilhando do céu."(Devaneio do Narrador)

O trabalho de criação requer, primeiramente, muita inspiração; pode surgir um tema ou você associa ideias, mas nem sempre isso dá certo. Inicialmente imaginei este texto com uma associação a uma série do History Channel que se chama “Mestres da Restauração”, onde uns sujeitos muito habilidosos transformam sucatas em peças de arte totalmente restauradas. Só que mudei de ideia... 

Em 2004 fui morar na montanha e, num belo dia, andando de bicicleta, conheci a dona Vilma que possuía uma loja de artesanato. Há tempos eu procurava uma árvore de Natal e encontrei uma lá que foi feita a partir de um galho de cipreste (“cedrinho”). Como excelente artesã, dona Vilma logo pensou em transformar o galho em alguma coisa bonita e assim o fez. 

Só que a produção não foi simples: primeiro ela deixou o galho num viveiro de periquitos Agapornis durante três anos para que eles “limpassem” o galho dos insetos e outros pequenos bichos. Esse periquito, só por curiosidade, também é conhecido por "Love Bird", termo em inglês originado do grego (ágape = amor; ornis = ave ou pássaro). 

Passado o tempo, ela pegou o galho e aí tratou a madeira para montar a arte. Quando vi, pedi para reservar, deixei a bicicleta em casa, peguei o carro, voltei e comprei. Colocada ao lado da bandeja mágica, durante o ano perde a decoração natalina (que ela disse que eu poderia incrementar, se eu quisesse) e enfeita a sala. 

Com o tempo houve o desgaste natural e resolvi procurar alguém que pudesse fazer a restauração (claro que houve alguma influência da ideia da série que eu falei). Encontrei uma loja muito simpática e propus o trabalho que foi aceito e hoje tenho o resultado. Minha árvore foi toda restaurada, mantendo a ideia do projeto original, recebeu tratamento contra cupins (madeira tem dessas coisas) e uma camada de verniz, além de enfeites novos (alguns antigos foram aproveitados também). Para mostrar a evolução eu fiz o video abaixo e achei que a música tinha muito a ver com tudo isso (coisas que a gente sente). 

♪“Quando eu não estiver por perto, canta aquela música que a gente ria. É tudo que eu cantaria e quando eu for embora, você cantará”♫



Boa Tarde! Eu sou o Narrador.
 
UPGRADE (14/05/2022)
 
A história da árvore continuou e começa com uma lenda...
 
" Eslovenka era uma velha curandeira medieval da Europa, que morava no meio da floresta e fazia o bem para muitas pessoas do povo. Um certo dia, porém, um conde invejoso resolveu acusá-la de bruxaria e os guardas foram procurá-la. Apareceu, porém, um anjo na casa desta mulher, dizendo que, para tornar sua casa invisível contra os inimigos, ela deveria colocar proteções decoradas nas beiras da sua residência. Assim, ele a ensinou a fazer lambrequins de madeira. Depois que Eslovenka colocou estes enfeites na sua casa, ficou invisível para os seus inimigos. A partir de então, a curandeira ensinou as pessoas a fazerem lambrequins nas suas casas para se protegerem dos inimigos."
 
É raro eu retornar a algum texto, mas achei que valeria a pena dar continuidade à história da árvore. Quase dez anos depois, a velha árvore deu sinais de cansaço. O tempo e os cupins consumiram parte de sua estrutura e foi necessário uma nova restauração. Procurei novamente alguém que se dispusesse a reformar essa antiga companheira e encontrei a Sra. Raquel Zanelatto que me apresentou à lenda. Bom... o que isso tem a ver com a árvore? A explicação veio da Sra. Raquel: quando construiu sua casa, a primeira parte consistiu numa casinha destinada à guarda de material da construção. Depois de pronta, para não perder a estrutura, resolveu dar o nome de "Casa da Eslovenka" onde minha árvore ficou um bom tempo até que "ela dissesse o que queria". A inspiração demorou, mas o conceito foi retornar à sua própria origem sem nenhum adorno artificial. Abaixo as fotos com os resultados e meus agradecimentos à Sra. Raquel que fez a transformação, à Sra. Doralice Horn que fez a representação da Eslovenka usando somente palha natural e à Sra. Amália Selenko que fez os trançados.

Casa da Eslovenka

Manuscrito da lenda

Interior da casa

Lambrequim
 
"Eslovenka"
 

Boa Noite! Ainda sou o Narrador!

sábado, 17 de agosto de 2013

E se... uma parábola sobre o livre arbítrio.

Todos os dias encaramos situações, onde nossas decisões podem mudar nosso destino e, eventualmente, ficamos na dúvida se agimos certo ou não. Um pensamento costuma ser presente: “E se...?” Só que, nesse ponto, já não adianta mais: o que foi feito está feito e não tem volta (e mais uma série imensa de frases de efeito, nessa mesma linha, incluindo a exclamação: “Deu merda!”).

E se você está lendo este texto, isso significa que morri! Esquisito né? Mas e se isso fosse possível (morrer e escrever um texto depois, sem utilizar alguém com poderes mediúnicos)? Como não é possível (até onde se sabe), vou contar essa história na terceira pessoa mesmo...

Como de hábito, ele chegou ao aeroporto quase duas horas antes do embarque. Os totens de autoatendimento, para o check in, estavam inoperantes, o tempo estava nublado e alguma coisa no ar parecia cheirar mal. Resignado, foi para a fila achando que ia demorar um século (que bom que chegou cedo!), mas foi rapidamente atendido pela simpática Nat que soltou a seguinte pérola: 

- Quer embarcar mais cedo? Tem dois voos antes do seu com lugares vagos! 

Ele quase não acreditou na oferta, pensou dois segundos e escolheu o adiantamento. Voo no horário, avião vazio, também trocou o assento do "21-D" (corredor) para o último, lá na cauda do avião ("janelinha" sem ninguém do lado). “Que sorte” - pensou. O que ele não sabia é que a "sorte" era uma “pegadinha” do destino. Enquanto fotografava a paisagem fantástica da Baía de Guanabara, subitamente o mar ficou revolto e de lá saiu o Godzilla que agarrou o avião partiu-o ao meio (exatamente na fileira 21), jogou a parte da frente na baía e a cauda caiu na pista do aeroporto. Refeito do susto, meio pendurado na sua cadeira, saiu do avião e logo viu alguém orientando os passageiros. No que pensou: - E se eu não tivesse adiantado o voo? E se eu ficasse na fileira 21? Quando, então, descobriu que estava morto e que a tal pessoa era um anjo guiando os demais na direção da luz (aquelas coisas que todo mundo já ouviu falar, mas pouca gente tem vontade de saber direito como é). 

- Com licença, “seu” anjo! Tem alguma coisa errada aqui. 
- Acho que não! Seu nome está na lista de passageiros. 
- Mas esse voo não era o meu! A mocinha me enganou! 
- Ah! A Nat! Bonita né? Impossível resistir! É "anjo da morte estagiária", mas já vi que logo receberá seu manto preto e o cajado. Conseguiu juntar vários passageiros. 
- Mas pera lá! Isso foi propaganda enganosa! Vou reclamar com o ...
- Claro que não! - o anjo interrompeu - Você teve a opção de manter seu voo. Adiantou porque quis. Isso é chamado de livre arbítrio, ou você nunca ouviu falar disso? 
- Ah! Mas eu mudei meu assento. Lá atrás as outras cadeiras vazias amorteceram a queda. Mereço um ponto por isso! 

Essa discussão ainda durou mais alguns minutos, mas não teve jeito: o anjo foi implacável. Mas “e se” ele não embarcasse mais cedo? Será que, mesmo assim, o Godzilla apareceria justo no voo dele? E se...

 
Boa Noite! Eu sou o Narrador.

N.N: A música "E se" é de autoria do Chico Buarque de Holanda e interpretada por Francis Hime.

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

O Primeiro Dia dos Pais

Vocês lembram do Leo e da Mônica, aquele casal que, no ano passado, participaram do “Conto do Dias dos Pais”? Na época eram jovens formandos, ela em Letras e ele em Turismo, e que, oito meses depois, em abril, tiveram Yasmin. 

A gravidez gerou bons frutos: além da filha (claro), Mônica fez as pazes com o pai que ofereceu o gerenciamento de sua pousada para Leo. O estabelecimento ficava numa dessas ilhas (que na verdade são bairros) com uma infraestrutura básica, onde as pessoas andam a pé, de bicicleta ou charrete de aluguel e veículos automotivos são exclusivos dos serviços públicos (salvo os barcos, evidentemente). O casal também ganhou uma casa, próxima ao trabalho, que era modesta, mas tinha um jardim com várias flores e uma cerca viva de jasmins. Aliás foi esta a origem do nome da menina. 

Bom... não pense o leitor que morar em ilha paradisíaca não traz alguns problemas. No dia do parto caiu uma tempestade, as comunicações com o continente foram interrompidas, assim como qualquer tipo de transporte (talvez um submarino resolvesse...). Mônica começou a sentir as contrações perto da hora do almoço, mas “segurou a onda” (já que não tinha outro jeito) até que, lá pela meia noite... 

- Leo, acorde! A bolsa rompeu. 
- Fique tranquila, Mônica! A tempestade já parou, pegaremos a barca das quatro horas e dará tempo de chegarmos ao hospital. A médica falou que primeiro filho demora. 
- Demora o caralho porra nenhuma nada! Já estou com uma dor filha da puta enorme há horas e agora acho que nasce!!

Nessa descrição, vou pular os detalhes mórbidos da confusão, como o banho de lama que Leo tomou ao tentar livrar a ambulância de um atoleiro, a cara de espanto da acadêmica bolsista, que estava de plantão no único posto de atendimento médico da ilha, ao chegar na casa e ver que Alcione (a cozinheira da pousada que também era parteira nas horas vagas) tinha resolvido a situação (“dona Mônica fala muito palavrão, né seu Leo”) e o “piti” homérico da mãe da Mônica, quando soube do ocorrido (naturalmente criticando o ex-marido, mas isso foi devidamente relevado, já que era costumeiro). Tudo isso, hoje, é motivo de incontáveis histórias que foram registradas num diário, para quando Yasmin estiver mais velha. 

Após o almoço de domingo, onde estavam os pais de Leo, trazidos por seu sogro, e os padrinhos, Eduardo e Bia, Mônica saiu um pouco para amamentar e Bia foi atrás. Já que, para Leo, era o seu primeiro almoço de dia dos pais (como o próprio), Yasmin usava uma camiseta com os dizeres “Meu Pai, Meu Herói” (isso não precisa muita explicação). 

- Como Leo está se saindo, Mônica? 
- Melhor que a encomenda! - ela riu. 
- Espero que Eduardo seja assim também, bem diferente do que aquele texto do “pai participativo”
- Quer saber, Bia? Que se fodam danem esses pseudointelectualóides que escrevem essas coisas. Pai é pai, mãe é mãe, são pra sempre, cada um faz a sua parte e os filhos que entendam isso. O amor será incondicional independente do que eles possam pensar. Eu aprendi isso e espero que todos os filhos por ai aprendam também! 

E a noite caiu lá naquela ilha, onde tudo é tranquilidade... 

  Boa Tarde! Eu sou o Narrador.