quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Mosquitos do Verão

Trabalhar num pronto-socorro requer habilidade, conhecimento e também um tanto de experiência. Algumas coisas não estão nos livros, não são evidências científicas e só aqueles que labutam nesses locais é que sabem o que acontece. 

Ainda acadêmico, aquele jovem médico que trabalhou no Réveillon 2012/2013, fez seu primeiro plantão num PS municipal, de uma cidade litorânea, exatamente no dia primeiro de janeiro de um ano qualquer. Como pouco sabia, procurou alguma informação com um colega mais velho que logo deu as dicas: 

- De manhã não acontece nada porque os queimados pelos fogos, os alcoolizados e os com os pés cortados já chegaram de madrugada; o restante do povo tá dormindo. De tarde recomeça, mas com as quedas, principalmente da laje. 

O jovem aluno não entendeu grandes coisas ("como assim, queda da laje?"). Só que não tardou muito para o entendimento, já que o primeiro traumatismo de cabeça que ele atendeu foi de uma criança que estava numa laje com um tio que "tomara todas" e que resolveu soltar pipa. Caíram os dois. Para a sorte da criança, o tio amorteceu sua queda, mas ele foi parar na neurocirurgia. Na sequência de pacientes veio insolação, queimaduras solares diversas, mais alguns alcoolizados, mas, de repente, surgiu uma moça com o as pálpebras inchadas e rosto meio desfigurado, sugerindo até algum tipo de agressão. 

- Como é o seu nome? - perguntou o acadêmico. 
- Ana Paula – respondeu a moça, algo rouca. 
- O que foi que aconteceu? 
- Foi assim doutor... 

Ela contou que alugara uma casa na praia e que ficara maravilhada com o lugar. Apesar do calor, havia uma boa brisa, a casa possuía ventilador de teto e era muito aconchegante. Como o local era tranquilo, ela deixava as portas e janelas abertas o tempo todo, inclusive à noite. Só que ela não foi avisada que, lá pelas dezessete horas (e até às vinte horas, mais ou menos), era conveniente fechar tudo, pois chovia, surgiam as poças de água e os mosquitos apareciam, atacando de forma implacável. 

- Mas a senhora não usou nada para espantar os mosquitos? Não tinha um espiral, um espanta mosquito elétrico ou, então, um repelente de passar no corpo?
- Doutor! Claro que sim! Mas esses mosquitos eram diferentes de tudo que eu já tinha visto na vida. Como nada resolvia, achei uma garrafa de tequila e mandei pra dentro.
- Mas a senhora não me aparece alcoolizada, só está com uma reação alérgica. 
- Pois é, doutor. Com a tequila no meu sangue, os bichos enlouqueceram de vez. Alguns aproveitaram o ventilador de teto para voar como se fosse numa asa delta; alguns ficaram reunidos em volta do espiral como se fumassem narguilé. Em dado momento, resolvi abordar um casal de mosquitos, em total situação libidinosa, que estava em cima daquele lance de pastilha que a gente coloca na tomada. Eles até foram legais, pediram desculpas, mas é que pensaram que ali fosse a sauna. A coisa ficou tão esquisita que eles saíram de lá, tomaram banho e usaram o repelente de corpo como desodorante em aerossol. Depois foram até a raquete elétrica para deixar os cabelos em pé. 

Achando que tudo aquilo era uma pegadinha dos seus colegas mais velhos, passou o caso para um médico mais antigo e achou melhor procurar a sala de sutura, onde a coisa deveria ser mais amena. Devidamente medicada, algum tempo depois, Ana Paula acordou na maca do PS e, ao abrir os olhos (finalmente desinchados) deu de cara com um mosquito em cima do seu nariz que reclamou: 

- Acorda logo, Natasha! Volta pra casa que eu perdi a festa! Hoje vê se toma absinto!



- Natasha é o caralho! Meu nome é Ana Paula! 

Nesse momento ela levantou, arrancou o soro, pegou a maca como se fosse um pedaço de madeira e saiu dando “macada” em tudo que é canto, na tentativa, desesperada, de “detonar” o mosquito safado. Contida por vinte e cinco seguranças, foi sedada e internada na ala psiquiátrica do hospital, até que foi resgatada pela amiga gostosa de sempre. 

- Porra, Ana Paula! Dessa vez você superou todas as outras! Que foda! Vê se toma jeito e, da próxima vez, consulta um site desses de previsão do tempo que até lá eles falam de mosquitos.  


Boa Noite! Eu sou o Narrador.

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